segunda-feira, 14 de maio de 2012

Fama cultivada safra a safra - por Michele Montanha

Novos mercados surgem, o mapa do vinho
muda, mas o sucesso de Bordeaux continua inabalável, principalmente, com o
Château Cheval Blanc






Famosa pelos rótulos desde tempos remotos, Bordeaux
nunca deixou de ser o centro das atenções para quem busca estudar ou apenas
conhecer a fórmula de se fazer bons vinhos. Diz a história que foram as legiões
do Império Romano que levaram a viticultura para a França. Na segunda metade do
século XVII, a região despontou para o sucesso, com vinícolas criadas por
ambiciosos produtores que tinham como foco principal o mercado da Inglaterra.
Os franceses souberam explorar muito bem o próprio solo, saltando à frente de
países como a Itália que, naquela época, produziam vinhos apenas para consumo
familiar. Amantes de novidades, eles absorviam rapidamente as inovações
tecnológicas.





Aprenderam desde cedo a explorar de maneira correta
suas terras e a valorizar seu produto. Descobriram, por meio de estudos, os
melhores métodos de plantar vinhas e obter sucesso após a colheita. Como
resultado, obtiveram uma seleção de vinhos aprovada pelos consumidores. Mais
tarde, escolas especializadas em viticultura surgiram – e Bordeaux ganhou fama
ao redor do planeta.



A cidade mais famosa no mundo vinícola, cortada pelos rios Gironde, Garonne e
Dordogne, encanta pelos belos edifícios e paisagens. Revela elegância, arte e
cultura. Aqui estão mais de 20 sub-regiões, conhecidas pela sigla AOC
(Appellation de Origine Controlée), entre elas as mais conhecidas são Pomerol,
Médoc, Graves e a famosa Saint-Emilion. Passar por essa cidade medieval,
tombada pela Unesco, e não provar seus vinhos é inaceitável. E, nem só de seus
famosos Châteaux, como Lafite, Margaux, Latour, Haut-Brion, Mouton-Rothschild,
Cheval Blanc e Petrus, vive a região. Pequenos produtores, ainda não tão
famosos, fazem bons vinhos e, o melhor, que cabem no seu bolso.



Na Union de Producteurs de Saint-Emilion, por exemplo, é possível adquirir
algumas preciosidades. No local, o visitante pode conhecer o processo de
fabricação da bebida e ainda degustar o vinho que quiser. Nesse tempo, vale a
pena conhecer a seleta produção de Saint-Emilion, como o Galius Saint-Emilion
Grand Cru, vinho que provém da seleção de seus melhores terroirs. Contém 75% de
uva Merlot, 20% de Cabernet Franc e 5% de Cabernet Sauvignon. Um tinto muito
rico e concentrado, com atraentes taninos.



Outro que faz bonito é o Château Grangey, um Saint-Emilion Grand Cru (80%
Merlot e 20% Cabernet Sauvignon). Tem bouquet agradável, dentro de uma
estrutura de corpo sólido. É um vinho que já vem com a promessa de um bom
envelhecimento em cave. Outro tinto interessante é o Château Haute-Nauve,
também Grand Cru, uma bebida de bela cor, com um bouquet de finesse rara.



Em Graves, uma visita ao Château Haut-Brion é imperdível. Degustar seus vinhos
da safra de 2003, um sonho. Se para os tintos essa foi uma safra diferente,
onde a elegância deu lugar à força, para os brancos foi dessas colheitas que
entraram para a história. O frescor da uva Sauvignon Blanc na boca transmite a
sensação notável de mel com notas de amêndoas. Já a colheita de 2004 está se
mostrando excepcional. O ano foi mais frio e úmido; a safra, mais generosa em
quantidade. O inverno foi rigoroso e seco, com pouca chuva entre janeiro e
junho. Junho também foi bem quente, possibilitando ótima floração. O resultado
é a volta da elegância para os tintos e a continuação da qualidade dos brancos.




Suor e milagre




Não só no Novo Testamento o vinho alcançou status de
milagre. O Château Cheval Blanc, em Saint-Emilion, entrou definitivamente na
rota dos grandes vinhos por um desses acasos difíceis de explicar. Sua fama
remonta a 1947, ano de temperaturas elevadas e clima seco – considerado difícil
para imaginar uma produção de bons vinhos. Mas, por uma alquimia miraculosa,
dessas que acontecem apenas uma vez na vida, o que se produziu com essa safra
surpreendeu os mais importantes enólogos do mundo.



Kees Van Leeuwen, atual consultor de enologia da vinícola, explica que a
produção de um vinho como o de 1947 é praticamente impossível de se repetir.
“Aquele ano foi excepcional, mas muito atípico, com uma forte degradação
alcoólica e um pouco de açúcar residual, seguindo uma pausa de fermentação, e
acidez volátil bastante elevada”, diz Leeuwen. “É um vinho milagroso, não
conseguimos mais produzir outro como aquele, devido à presença dos açúcares
residuais.”



Em relatos registrados pela Cheval Blanc em 1947, consta que a fermentação do
vinho era difícil, a bebida não estava perfeitamente seca, a acidez volátil era
bastante elevada, o amplificador aromático e o suporte de estrutura não
funcionavam bem. Era como assistir a um terrível acidente da natureza. Mas o
temido desastre transformou-se no que chamamos de “néctar”, com poderosos
aromas de frutas secas, especiarias, e um pouco de pimenta, devido a seu teor
alcoólico.



Um vinho que desafiou a natureza e que quem o degusta, não o esquece. O Château
Cheval Blanc 1947 em garrafa magnum é considerado por muitos “o melhor vinho da
história” e, até hoje, é vendido por valores exorbitantes, a milionários
colecionadores ou negociantes. É um rótulo que guarda seu terroir na memória.
Detalhe: nessa época, a vinícola ainda não tinha propriamente um enólogo, mas
um mestre responsável pela vinificação, Gaston Vayssière.



Kees Vans Leeuwen, que é também professor na Universidade de Bordeaux, explica
com muita simplicidade a produção dos vinhos do lugar, seu solo e suas variedades.
Quando questionado sobre a queda no consumo de vinhos na França, Leeuwen faz
questão de ressaltar que esse comportamento tem suas razões. “Estamos vivendo
uma mudança no modo de vida: os franceses que consumiam muito vinho agora
passam menos tempo à mesa”, diz. “Temos também o problema do controle da taxa
de álcool ao volante, o que limita a venda de vinhos nos restaurantes.”



O Cheval Blanc não utiliza herbicidas em seus vinhedos, o que interfere
positivamente no sabor final da bebida. Sua variedade mais importante é a uva
Cabernet Franc, seguida por uma parcela pequena de Cabernet Sauvignon. Em nossa
degustação, o Cheval safra 2000 encheu a boca e os olhos. Um rouge intenso,
bastante aromático, ligeiramente picante, mineral, apresentou bom corpo e final
muito marcante. Outras safras que merecem destaque na história da Cheval Blanc
são: 1921, 1949, 1950, 1961, 1964, 1971, 1975, 1982, 1990, 1998, 2000 e 2005.
Delas saíram rótulos excelentes e que mantêm o nome de Bordeaux inscrito como
epicentro do mapa mundial do vinho. Onde deve continuar por muito mais tempo.






A jornalista Michele
Montanha, mestre em Gestão e Marketing pela Universidade de Paris X, na França,
lançou em março desde ano o blog "Vin&Plaisir",
que em francês significa "Vinho e Prazer". O blog tem o objetivo de divulgar as
novidades do mundo do vinho e da gastronomia, além de ser direcionado as
mulheres que podem divulgar seus trabalhos nos canais " Sommelières" e "Mundo
das Chefs".


O blog esta muito legal!
Conta com um conteúdo variado e com uma linguagem muito simples!






Visite o blog: vinplaisir.blogspot.com











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