quinta-feira, 18 de dezembro de 2014

Javier perdeu os vinhedos e nunca teve Paz.





Não tinha mais jeito.

Não adiantava passar a noite em claro, porque o granizo já tinha feito um estrago que seria sentido para os próximos 2 ou até 3 anos.

Javier não era de desanimar, mas nesse caso seria dar murro em ponta de faca.

Mandou os amigos pra casa e entrou para tomar um banho e relaxar um pouco.

Paz nem se incomodou com a saída dos outros, ficou onde estava, pegou uma garrafa, abriu e se serviu como se estivesse em casa.

Javier olhou espantado e foi pro banho como se estivesse sozinho.

Mas saiu do banho como se tivesse alguém em casa.

Colocou uma bermuda, chinelos legitimos havaianas e acompanhou Paz na meditação regada a vinho.

Meditação mesmo.

Os dois pegaram as taças e tomaram uma, duas....

Abriram outra garrafa...

Nenhuma palavra.

Quando a garrafa acabou os dois se levantaram, seguiram pro quarto como se fosse uma rotina.

Pela manhã Paz se levantou enquanto Javier dormia e foi cuidar da vida.

Javier acordou de cabeça inchada, não sabia se tinha sonhado com a perda dos vinhedos ou se era a dura realidade.

Demorou pra pensar em Paz.

Lembrou como quem lembra de um sonho distante, em pedaços.

Passou o dia nos vinhedos contando os prejuízos.

A noite Paz entrou na sala, pegou um vinho na adega e abriu como no dia anterior.

Beberam, se amaram, dormiram...

Pela manhã Javier lembrava de mais detalhes e até apalpou a cama para ver se ela ainda estava por lá.

Foi assim por algumas semanas.

Quando a colheita começou nas cidades vizinhas, onde o granizo não castigou, todos partiram para ajudar, e Javier passava o dia procurando Paz.

Ela só aparecia mesmo a noite.

Depois da colheita terminada, as festas se seguem e a qualidade das uvas se já eram comemoradas em anos normais, em anos de granizo eram muito mais.

Naquela noite Paz não apareceu.

Cada gole durava uma eternidade sem ela.

O dia também foi estranho, sem vinhedos, sem uvas, sem vinho e sem paz.

A noite ele até escolheu o vinho, a taça, mas nada de Paz.

A semana passou e ele começou a perguntar na vizinhança se alguém sabia explicar onde ela estaria.

Só no terceiro dia de verdadeiros interrogatórios é que um morador da cidade vizinha disse:

"Ela anda por aí. Com um gringo que veio para a colheita. Os dois não se largam, se conheceram não faz nem uma semana."

Javier voltou pra casa e passou o dia pensando e meditando com o melhor vinho que tinha.

A noite Paz entrou, pegou uma taça, beberam, se amaram, dormiram.

Ela foi embora pela manhã.

Javier nunca mais teve paz.

Paz só aparecia quando tinha vontade.




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