segunda-feira, 31 de dezembro de 2012

A Euromilhões não Mudou a Vida de Pedro...

 

















A energia de Pedro é uma coisa impressionante.

O último a dormir e o primeiro a acordar. 


Sempre!

Fora o ruído.

Brigava, discutia, ria, contava piadas, cantava, bebia, chorava.

Pedro coordenava a colheita de 3 vinícolas na região do Dão.

Tinha uma equipe de seguidores, que vendo de longe parecia uma equipe de loucos
que aturavam a inquietude daquele rapaz.

Sim, Pedro é um rapaz de 25 anos.

Trabalhou em colheitas na Itália, sul da França e em todo Portugal.

Um dia todos acordaram e nada de Pedro. 


Olharam para a cama vazia e toda
arrumada e nada de Pedro.

Deram uma volta pelos vinhedos, sem sucesso.

A colheita seguiu sem nenhum problema. 


Mais calma e silenciosa, é verdade.

4 dias depois Pedro apareceu. 


Óculos escuros, carro novo, roupa limpa, mas o
mesmo jeito.

Quando tirou os óculos deu pra ver os olhos vermelhos, olheiras e um ar
cansado.

José António já tinha outro responsável pela colheita e apenas olhou pela
fresta da cortina e nem se deu ao trabalho de falar com Pedro.

Depois de contar uma série de piadas novas, falar palavrões e discutir futebol,
se dirigiu ao escritório do patrão.

-Seo Zé.

-Fala Pedro! Perdeu o juízo?

-Nada. Perdi o sono, isso sim.

-To vendo que estas com mal aspecto.

-3 dias sem dormir. Festa aqui, festa ali, amigos que aparecem, amigos
telefonando o dia inteiro. Não aguento mais.

-Afinal o que houve?

-Não sabes ainda? Ganhei na Euromilhões! Acordei com festa. 


Gente chegando em
casa, gente me pedindo dinheiro, pedindo ajuda, um inferno. 


Deixei em cima da
mesa e jamais pensei que ganharia. 


Inês conferiu os números e saiu contando pra
Deus e o mundo. 


Perdi o sossego.

Mandei Inês para a casa dos primos no Brasil. Meus filhos estão na casa dos
avós em Lisboa e eu vim aqui pra trabalhar.

-Trabalhar? Você pode comprar isso tudo se quiser!

-É coisa pra se pensar, mas por enquanto quero trabalho, convívio com os amigos
que ainda não sabem de nada e depois disso vou pra Califórnia.

-Califórnia?

-Sim. Conversei com uma tia que mora por lá. Me disse que uma crise derrubou os
preços das vinícolas e que os vinhos são excelentes.

-Sabes ao menos falar inglês?

-Claro que não. Mas isso eu aprendo.

Pedro trabalhou como nunca, discutiu como nunca, acabou com o sossego
do lugar, até que caiu no sono e foi até o dia seguinte.

Com o final da colheita reforçou o pagamento dos amigos e seguiu para seu sonho
americano.

Exatamente como o planejado comprou uma bela vinícola bem abaixo do preço. 


Na
primeira colheita levou 20 amigos portugueses para tocar o trabalho.

Quando o ônibus chegou, os amigos olharam uma roda com 5 ou 6 trabalhadores
rindo como loucos e um falastrão maltrapilho, gesticulando, rindo, mãos sujas e
sorriso no rosto.

Quando percebeu a chegada dos portugueses correu em direção a eles. 


Tentou
abraçar a todos ao mesmo tempo. Ria, chorava, gritava.

A festa invadiu a madrugada. Pedro ainda era Pedro. 


Falava um inglês quase
incompreensível, uma pronuncia péssima.


Mas encantava.

Os amigos portugueses esperavam um novo homem, chique, metido e
esnobe. Nada
disso!

-Precisei sair da minha terra para viver da forma que vivia por lá. 


Percebo
hoje que aquele dinheiro só serviu para me afastar do meu país. 


Eram tantos
pedidos e bajulação, que precisei vir para cá. 


Aqui sabem apenas que sou um
agricultor e produtor de grandes vinhos. 


Lá esqueceram de todas as colheitas
que fiz. 


Virei apenas o ganhador da Euromilhões.

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