Em meados da década de 80 South Beach
já era um sucesso.
Sentar naquela praia e ver o mar azul claro era e continua
sendo uma terapia. Naquela manhã vi um velho caminhando com dificuldade, deixou
suas coisas na areia e caminhou em passos bem lentos até o mar.
Confesso que
fiquei apreensivo!
Mal a água atingiu sua cintura e já mergulhou, deu as primeiras braçadas e
seguiu nadando até onde não haviam mais ondas.
Fiquei em estado de alerta.
A qualquer momento chamaria o salva vidas ou até
tentaria um ato heróico.
Mas ele e o mar eram velhos conhecidos.
Cada braçada lenta levava o velho mais
longe e percebi que eu estava aprendendo com aquilo.
Foram 30 minutos de
braçadas calmas, perfeitas, intermitentes.
Quando saiu do mar a dificuldade voltou.
Fui surpreendido dessa vez pela
emoção!
Caminhou até suas coisas, tirou a sunga sem nenhum pudor, se enxugou, colocou
um short e uma camiseta e seguiu em direção a Ocean Drive.
Eu também segui meu caminho até o News Café.
Pedi um fettuccine com salmão, uma
taça de vinho branco da Califórnia e percebi o velho chegando.
A única mesa disponível era ao lado da minha.
Ele se sentou e não pediu nada.
O
garçon já sabia: uma meia garrafa de vinho italiano, uma caesar salad e água.
Não resisti e puxei conversa: - O senhor nada todos os dias?
-Desde os 10 anos, faz 80!
-Meu Deus!
-Não há nenhum esforço nisso, participei de maratonas aquáticas, jogos
olímpicos e grandes travessias, na água e na vida!Infelizmente há 10 anos fui atropelado e minhas pernas já não acompanham meus
braços. Na água me sinto forte, livre, rápido, ágil!
-E o vinho? perguntei.
-Ah isso veio antes da natação. Meu pai colocou um dedo mergulhado no vinho
direto na minha boca no dia em que fui batizado na Itália. Família de
agricultores, fazíamos Barolos fantásticos!
Nessa altura éramos amigos, falávamos em italiano e percebi que Pietro conhecia
todos os vinhos possíveis, sem nenhum preconceito de país, cor de uva ou tipo
de vinho. Era um expert!
A noite jantamos com nossas mulheres no mesmo News Café. Lugar de jovens,
modelos, fotógrafos e artistas. Nenhum tão jovem como Pietro!
Saí de lá com a ideia de que somos anfíbios, basta querer!
Lembrei do poema do alagoano Jorge de Lima:
A água é falsa, a água é boa.
Nada, nadador!
A água é mansa, a água é doida,
aqui é fria, ali é morna,
a água e fêmea.
Nada, nadador!
A água sobe, a água desce,
a água é mansa, a água é doida.
Nada, nadador!
A água te lambe, a água te abraça
a água te leva, a água te mata.
Nada, nadador!
Senão, que restara de ti, nadador?
Nada, nadador.
Jorge de Lima
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